Saturday, December 16, 2006

Sempre - Edu le parkour brasil

Sempre , porque é melhor que seja assim.

Parkour e Medo: Minha resposta para um Traceur

ESTE TEXTO NÃO CORRESPONDE MAIS AO MEU PENSAMENTO SOBRE O TEMA E aí Tiago (Tiago é um experiente traceur de Rio Claro. Escrevi este texto logo depois de conversarmos sobre o medo, mas acabei não enviando - o para ele, (agora virou artigo) Depois que conversamos fiquei pensando naquela questão da coragem e então resolvi escrever algumas coisas. A maioria você já sabe, mas aproveite o que sobrar.
O medo é importante para nos protegermos contra perigos reais ou imaginários. Entretanto, sabemos que é bastante sedutor entrar numa zona de risco a ponto de afrontar nossas qualidades de autopreservação. Implica em superação, em reconhecimento narcísico, mas principalmente, no reconhecimento de potencialidades adormecidas, ignoradas ou negadas. O reconhecimento dessas potencialidades traz de volta um certo grau de liberdade e independência, fortemente podados, durante a construção de nossos aparatos mentais de autopreservação.
Uma enorme parcela do medo que sentimos é aprendida durante a vida. Aprendemos o que temer e inclusive como sentir esse medo. Uma prova clara disso está nas crianças. Freqüentemente percebemos que elas não temem coisas que os adultos fogem de medo. Por isso mesmo, sempre ouvimos coisas como: acrobacias devem ser aprendidas na infância. Imaginemos a seguinte situação: um menino de sete anos brinca a vontade na pracinha perto de sua casa e é surpreendido pelos seus pais quando está no topo de uma árvore. Sua satisfação naquele momento, por ter vencido o obstáculo, é enorme. No entanto, seus pais, preocupadíssimos com a integridade física do filho, quase desmaiam de tanto medo. Gritam para o menino descer, revelam em sua voz e em seu olhar toda sua fragilidade, suas fantasias de morte. Reagem com agressividade, dizem que se o menino cair irá morrer ou no mínimo ficar tetraplégico. Ou seja, inundam a criança com seus medos e fantasias, potencializam os perigos e pior, em sua angustia, ameaçam o filho com punições desmedidas. Isso está em tudo. Tememos que as crianças ponham sujeira na boca, pois ela ficará doente, tememos que ela não estude e não esteja pronta para o mundo competitivo, tememos que ela suba num muro e caia. Entretanto, o que fazemos nestes momentos é impedir que por si só conheçam as dimensões de seus limites e a realidade dos perigos da vida. Cuidar e instruir são necessários e definitivamente, para mim, não acredito que isso precise sofrer as conseqüências que acima citei.
Tentamos impregnar as crianças daquilo que nos impregnaram em nossa infância, sem auto-críticas, sem relembrar como era prazeroso subir nas árvores. Quando uma criança bem pequena vai a um ambiente desconhecido podemos observar seus medos e desconfianças. Ela se aproxima com cuidado dos adultos que não conhece. Vai aos poucos procurando segurança, bem devagar vai se aproximando do desconhecido que ela teme, mas que a fascina ao mesmo tempo. Tenderá a se aproximar primeiro de adultos que lembrem seus pais em sua versão carinhosa e protetora, ou seja, geralmente terá mais facilidade com mulheres. Depois de estar seguro com essas pessoas, poderá se aproximar de outras, agora com um pouco mais de confiança. Passado um tempo, a criança já pode correr e brincar pelo ambiente.
É mais ou menos assim que aprendemos a nos relacionar com os obstáculos no Parkour.

Parkour
Lembro que em meu primeiro treino saltei um bom tempo de um muro de cerca de 1,2m para a grama. Lembro também que tinha medo e saltava parado e para baixo. O mesmo aconteceu com o Rodrigo e com o Jacques. Entretanto, ao final do treino, sentimo-nos empolgados, porque apesar do pouco que tínhamos feito em relação ao vídeo do David Belle que tínhamos assistido na semana anterior, tínhamos superado muitos limites naquelas duas primeiras horas de treino. Foi quando gritamos pela primeira vez Le Parkour Brasil. Essa foi a primeira lição que tivemos sobre vencer medos. Fazer realmente aos poucos, não ter pressa, estar com os amigos e se apoiar na segurança que um dava para o outro.
Saltei muito de lugares baixos para pegar confiança principalmente no rolamento. Descobri que cair de calcanhar doía a coluna, que tinha que limpar o chão antes de rolar e que o corpo fica doendo muito no dia seguinte. Descobrimos sozinhos, sem ninguém interferir em nada. Como sempre gostamos de fazer grandes saltos, e continuamos gostando, chegamos precipitadamente, com cerca de um mês e pouco de treino aos três metros. Tivemos muito medo no primeiro salto. Tem um vídeo meu onde fico cerca de 15 minutos indo e voltando na beirada desse salto até ter coragem e saltar. Ainda não estávamos preparados, mas sabíamos que era possível. Por isso mesmo, conseguimos saltar sim e muitas vezes a cada treino, mas também nos machucamos algumas vezes devido à falta de técnica e outras vezes por insegurança.
Aprendemos outra coisa nesta época que é o seguinte: uma vez feito o salto repita-o sempre, transforme-o em corriqueiro, integre-o sempre em seu percurso, pois se abandoná-lo por muito tempo o medo retornava. Além disso, a altura muitas vezes é menos importante que outras variáveis daquele obstáculo em especial. Saber saltar de três metros de um lugar (x) pode ser totalmente diferente de saltar de três metros de um lugar (y). Por isso tudo, salte muito de lugares baixos, porque mesmo depois de experiente, há sempre a possibilidade de errar.

Insegurança
A insegurança surge geralmente em obstáculos difíceis ou inexplorados. Neste tempo em que treino, aprendi algumas coisas sobre isso: 1- Se estiver muito inseguro não faço. 2- Quando vejo alguém fazendo antes tenho mais segurança. 3-Tem coisas que não faço, não vou fazer e fim. 4- A mente deve estar sempre livre. 5- Quanto mais técnica eu desenvolvo, mais liberdade tenho para ser natural e isso ajuda muito - quando salto da passarela, por exemplo, eu simplesmente não penso, vou e faço. Sei que sou capaz, isso tem que estar internalizado, tanto a técnica quanto a consciência do limite do meu salto. Outras vezes você terá que ficar por horas avaliando o obstáculo, aceite isso. 6- Quando o obstáculo permite faço um treino de estudante. Aproximo-me devagar até pegar confiança e executo de uma vez.

Algumas dicas específicas
Salto de precisão: não importa a superfície que eu esteja imagino que meu ponto de chegada é um cano. Isso me obriga a cair com o calcanhar sempre para fora do ponto de chegada. Existem infinitas possibilidades de superfícies para se fazer um salto de precisão. Esqueça a idéia de treiná-lo apenas de uma forma, isso serve para todos os movimentos.
Cat leap: para mim, quando estou inseguro, mas sei que estou totalmente apto a realizá-lo, fica mais fácil entrar de lado na segunda parede. Os pés sempre chegam antes. Talvez para você possa ser diferente. Descubra, é sua responsabilidade.
Escalada: tento sempre entrar correndo e na parede (usando a mãos também), saltar para cima bem próximo a ela. Cada escalada é diferente, algumas vezes você terá que fazer de outras formas. Procure obstáculos que lhe obriguem a isso.
Estudante: antes de transpor o obstáculo estude o movimento, aproxime-se aos poucos do obstáculo. Por exemplo: Num salto de precisão você pode subir no primeiro cano e equilibrar-se nele. Depois, ensaiar o salto várias vezes caindo poucos centímetros antes do cano de chegada. Se o obstáculo permitir você pode também correr e saltar do chão para o cano de chegada. E, principalmente procure um obstáculo equivalente na altura do chão.
Big Jump: caia com a ponta dos pés sempre. Quando for executar um rolamento não desista, mesmo que ele saia errado role do jeito que for possível, mas evite rolar errado.
Confira se o obstáculo não é frágil. Passe a mão sobre ele para saber sobre sua textura.
Vá e faça. Por exemplo: A maioria das pessoas teme fazer um salto e pousar numa escada. Mas não há maiores dificuldades nisso. Então vá e faça, desistir no meio do caminho pode ser perigoso. É melhor aprender a se defender, pois num erro, é assim que você irá se proteger (mas,por favor, não erre)Treine muito antes, num local baixo, para torná-lo possível e vá de uma vez.
Nossas capacidades vão além daquilo que conhecemos. Estamos tão desacostumados a usar nosso corpo de maneiras diferentes, que acreditamos que somos incapazes de coisas que muitas vezes são possíveis. Depois de tanta influência da cultura, é ruim ver que aquilo que é natural passou a ser reconhecido justamente da forma contrária.